11 de set. de 2010

Do Desejo - Hilda Hilst


Acho que todo mundo já leu algo que gostaria de ter escrito ou ouvi uma música que parece ter sido feita para você.
“Do Desejo

E por que haverias de querer minha alma
Na tua cama?
Disse palavras líquidas, deleitosas, ásperas
Obscenas, porque era assim que gostávamos.
Mas não menti gozo prazer lascívia
Nem omiti que a alma está além, buscando
Aquele Outro. E te repito: por que haverias
De querer minha alma na tua cama?
Jubila-te da memória de coitos e de acertos.
Ou tenta-me de novo. Obriga-me.

Hilda Hilst”
Exatamente o que senti quando li esse poema de Hilda Hilst, a sensação de que ela escreveu exatamente o que eu gostaria de dizer, infinitamente melhor do que eu mesma. E é um deleite ver “nosso” pensamento na escrita de quem sabe escrever de fato.
É como escreveu, se não me engano, Lygia Fagundes Telles, por sinal melhor amiga de Hilda, “Falar por aqueles que esperam de nós a palavra que gostariam de dizer.” É algo que eu vejo como simplesmente místico.
Poetisa, escritora e dramaturga, nascida em Jaú (1930), faleceu em Campinas em 2004.
 Abordou assuntos ditos controversos como lesbianismo, homossexualidade e pedofilia em suas obras, mas em uma entrevista ao “Cadernos de Literatura Brasileira” Hilda disse que buscava em seu trabalho retratar a difícil relação entre Deus e o homem... não pode haver assunto mais controverso!!
Estou conhecendo um pouco da obra de Hilda Hilst.
“Tô Só

 Vamo brincá de ficá bestando e fazê um cafuné no outro e sonhá que a gente enricô e fomos todos morar nos Alpes Suíços e tamo lá só enchendo a cara e só zoiando? Vamo brincá que o Brasil deu certo e que todo mundo tá mijando a céu aberto, num festival de povão e dotô? Vamo brincá que a peste passô, que o HIV foi bombardeado com beagacês, e que tá todo mundo de novo namorando? Vamo brincá de morrê, porque a gente não morre mais e tamo sentindo saudade até de adoecê? E há escola e comida pra todos e há dentes na boca das gentes e dentes a mais, até nos pentes? E que os humanos não comem mais os animais, e há leões lambendo os pés dos bebês e leoas babás? E que a alma é de uma terceira matéria, uma quântica quimera, e alguém lá no céu descobriu que a gente não vai mais pro beleléu? E que não há mais carros, só asas e barcos, e que a poesia viceja e grassa como grama (como diz o abade), e é porreta ser poeta no Planeta? Vamo brincá
      de teta
      de azul
      de berimbau
      de doutora em letras?
      E de luar? Que é aquilo de vestir um véu todo irisado e rodar, rodar...
      Vamo brincá de pinel? Que é isso de ficá loco e cortá a garganta dos otro?
      Vamo brincá de ninho? E de poesia de amor?
      nave
      ave
      moinho
      e tudo mais serei
      para que seja leve
      meu passo
      em vosso caminho.*
Vamo brincá de autista? Que é isso de se fechá no mundão de gente e nunca mais ser cronista? Bom-dia, leitor. Tô brincando de ilha.”
Crônica de Hilda Hilst para o "Correio Popular" de Campinas-SP 


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